quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Correio de Leitores…

A FREGUESIA 31 – CRÓNICAS IV

Como diria Flaubert, “o futuro tortura-nos e o passado encandeia-nos. É por aí que se nos escapa o presente.”

1 - Se numa refeição o último sabor que nos fica é o do café, (para aqueles que habitualmente o tomam, óbviamente ) na vida política, são sempre as últimas benesses aquelas que ficam registadas na memória do eleitor. Ora, tem acontecido que em cada novo acto eleitoral, essas “benesses”, tornaram-se menos dissimuladas e por conseguinte menos ingénuas no que respeita aos seus reais propósitos eleitoralistas. Na verdade e apesar de estarem em absoluta concordância com um relógio eleitoral nada generoso e pouco condescendente, traduzem no fundo aquilo a que poderíamos chamar de esforço suplementar de governação. Em linguagem metafórica diríamos que se trata de um “cavar rápido da horta” a que os governantes recorrem na etapa final dos seus mandatos. Infelizmente para todos nós, as “leguminosas” assim semeadas, acabam por ver o seu crescimento condicionado pelas leis de uma suposta eficácia mediática em detrimento de um verdadeiro plano de desenvolvimento local, mais elaborado, abrangente e sobretudo, sustentado. Não devemos por isso estranhar, entre muitas outras coisas, os atapetamentos “asfálticos” disformes e inconsequentes como aqueles que a candidatura do CDS-PP se apressou e muito bem a denunciar neste mesmo Blog através do original método comparativo do tapete, como certamente se recordarão.

2 - Numa disputa política o que se visa não é estabelecer uma qualquer incontroversa objectividade ou verdade. O que se pretende é outra coisa, é impor versões contrastadas do mundo, é talhar perspectivas diferenciadas dos factos, é - literalmente falando - construir realidades alternativas. Por isso é cada vez mais comum observar-se que nem os eleitos governam exactamente de acordo com aquilo que prometeram nem as propostas são, frequentemente, o critério essencial para a decisão dos eleitores. Estes, os eleitores, avaliam cada vez mais a confiança que lhes suscitam os candidatos do que as propostas propriamente ditas. A complexidade da verdade só poderia confundir as pessoas e levá-las à dúvida, que em política representa o pior e o mais perigoso dos estados mentais. A primazia da forma ( nomes; listas) sobre o conteúdo ( programas ), origina a que sistematicamente se resvale do confronto de ideias para alucinadas e enraivecidas escaramuças que não esclarecem nada nem ninguém. É, num certo sentido sobre esta constatação que os Caldenses irão ajuizar os candidatos nestas próximas eleições autárquicas. Resumidamente trata-se de determinar quem de entre todos eles, deverá ser merecedor(a) dessa mesma confiança.

3 – Se por um lado, as campanhas eleitorais não evidenciam propriamente os momentos mais elevados da actividade política na medida em que são por regra e definição espaços de propaganda, de exaltação partidária, de exageros verbais, de incontinência retórica, por outro já vai sendo tempo de não sermos ingénuos ao ponto de acreditar que aqui nas Caldas pelo menos, as campanhas eleitorais proporcionam circunstâncias sublimes para o debate das grandes questões. É normalmente ao contrário. Contudo devemos ser honestos com nós próprios e questionarmo-nos em consciência sobre qual das candidaturas que se apresenta ao eleitorado Caldense mais se esforçou por uma aproximação à população em geral? A resposta parece-me óbvia, no entanto caberá a cada um de vós valorizar ou não, em consciência – repito – esse facto.

4 – Uma verdadeira educação política não tem necessariamente de anteceder o poder. Pressupõe contudo um espírito de aprendizagem constante, um conhecimento da realidade, um distanciamento, um permanente exame da validade das nossas convicções. È certo que o apelo do poder dita os ingredientes com que se cozinham os consensos e na receita do pragmatismo, as divergências devem ser temperadas e colocadas em banho- Maria. Poderão ressurgir mais tarde, mas tratando-se do bem comum e da dignificação de Caldas de S. Jorge, é aconselhável que essas divergências sejam sabiamente reprimidas. Os destinatários saberão certamente interpretar o que aqui referi.

E porque o post já vai longo, despeço-me por hoje com um pequeno excerto de um poema de António Aleixo intitulado – “Os Vendilhões do Templo”

Deus disse: faz todo o bem
Neste mundo, e, se puderes,
Acode a toda a desgraça
E não faças a ninguém
Aquilo que tu não queres
Que, por mal, alguém te faça.
Fazer bem não é só dar
Pão aos que dele carecem
E à caridade o imploram,
É também aliviar
As mágoas dos que padecem,
Dos que sofrem, dos que choram.
E o mundo só pode ser
Menos mau, menos atroz,
Se conseguirmos fazer
Mais p'los outros que por nós.

Até já

Bettencourt

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